segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Drive


Sem sombras de dúvida o filme mais estiloso do ano (não que eu tenha assistido a todos os filmes do ano), Drive apresenta uma estética que mistura neo-noir, indie e gore com primor pelo criativo diretor Nicolas Refn (Bronson, Valhalla Rising).

“Diga a hora e o lugar e te dou 5 minutos. Aconteça o que acontecer nesses 5 minutos, estou à disposição. Seja o que for. Mas o que houver após esses 5 minutos, está por sua conta. Entendeu?”. O protagonista sem nome (Ryan Gosling), mais conhecido como Driver (motorista, em português), é um dublê de Hollywood, mecânico na oficina do Shannon (Bryan Cranston) e, de vez em quando, transporta ladrões da cena do crime para um lugar seguro, com as condições da citação acima.

Essa é somente a base inicial que o filme apresenta do personagem. O enredo vai sendo tomado por intensidade e tensão gradativamente, até o fim, enquanto o protagonista revela sua personalidade.


Mesmo sendo quieto e durão, o motorista cria laços profundos com sua vizinha Irene (Carey Mulligan) e o filho Benicio (Kaden Leos), cujo pai está na prisão. A harmonia dessa “nova família” é quebrada pelo retorno do pai de Benicio, Standard (Oscar Isaac), homem arrependido por seu passado criminoso.

Ele é ameaçado por conta de uma dívida com gangsteres e põe sua família em perigo. Sem hesitar, o protagonista se dispõe a ajudá-lo. Por ordens, Standard deve roubar uma loja de penhores com o auxílio de Blanche (Christina Hendricks), enquanto o Driver o ajudará a escapar. Contudo, o plano falha traiçoeiramente e daí em diante o motorista dirige por uma estrada infernal e sanguinária.

Na teoria, a premissa não tem muitas novidades ou inovação, mas o mistério e a estética do filme vão envolvendo a trama numa aparente complexidade que nos captura.


Excelente como sempre, Ryan Gosling vive o protagonista icônico, clara homenagem aos heróis valentes e durões de filmes antigos, como os faroestes de Clint Eastwood. Trajando sua marcante jaqueta com um escorpião amarelo estampado nas costas, o personagem revela ser tão corajoso quanto qualquer super-herói. Sua motivação é o amor por Irene e Benicio – nada mais justo, honesto e humano do que o amor como motivo para um ser humano “se tornar um herói” (entre aspas, pois não se transforma no que já se é). Ele usa sua habilidade inigualável no volante como arma, escudo e pernas.

O romance entre os personagens de Gosling e da talentosa Mulligan é doce e delicado, assim como a química sutilmente forte que há entre os dois. Em geral, as atuações estão impecáveis e carregam perfeitamente o enredo sombrio do filme. Nenhum personagem é estereotipado ou caricato; todos têm consistência e complexidade, como todo ser humano real.

A originalidade de Refn está pulsante em Drive. A atmosfera oitentista e entorpecente, por si só, já faz o filme se sobressair no gênero ação. O diretor dinamarquês, que faz sua estreia numa produção norte-americana, coloca uma câmera no banco de passageiro, do carro conduzido por Ryan Gosling, e desvenda as ruas de Los Angeles, totalmente desconhecidas por ele. A câmera usada na frente ou na traseira do carro, como se fosse a visão do motorista, dá um toque especial para as cenas de fugas.

 

A iluminação do filme é crua e natural, o que ajuda na imersão do espectador. Uma bela exceção é o beijo desesperado no elevador, no segundo ato do filme, em que Refn brinca com a iluminação combinando com o impacto da cena.

Baseado num livro de 160 páginas de James Sallis, o roteiro escrito por Hossein Amini “linearizou” a narrativa cheia de flashbacks e saltos no tempo de Sallis, com exceção de alguns momentos em que o breve futuro (ou passado?) se intercala com o presente – tudo muito bem executado por Refn.

Drive tem mais violência do que aparenta. Uma ação visceral surpreendente para quem ainda está com a imagem do motorista na margem de um riacho, com Benicio e Irene, quente na memória.


A ótima trilha sonora de Cliff Martinez é composta de um synth-pop inquietante e retrô, que só cessa para dar lugar ao ronco dos motores dos carros. Destaque para a canção “A Real Hero”, a mais marcante do filme, cujo refrão remete perfeitamente ao protagonista sem nome. “And you have proved to be a real human being”. “A real hero, real human being”. Poucas trilhas sonoras são tão importantes para climatizar um filme como essa.

Aliás, o retrô não está só nas músicas: está no filme inteiro. A trilha, os carros, os locais e até a tipografia da abertura criam um clima que torna a época do filme indistinguível. Os produtores tiveram até o cuidado de evitar que prédios novos aparecessem no filme – apenas as tomadas aéreas mostram os arranha-céus de L.A., nos lembrando que o filme se passa no século atual.

Nicolas Refn é um dos diretores mais criativos da atualidade e, importante, sabe executar seu talento com eficiência. Drive é a prova concreta disso: um thriller melancólico, instigante, brutal e tocante, de primeira qualidade.

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Drive, 2011
Gênero: Ação, Thriller, Drama 
Diretor: Nicolas Winding Refn
País: EUA
Duração: 100 min

Nota: 10


2 comentários:

  1. Baixarei como sempre, apesar de, mesmo lendo sua crítica, não me interessar muito pela história. Estou confiando na sua avaliação.

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  2. Tá aí, pra mim é uma incógnita se você vai gostar ou não. Mas lembre-se que eu sou mais eclético do que um panssexual, gosto de tudo que é gênero - e acho isso uma ótima característica para um crítico. Só preciso começar a ver filmes de terror também, acho que é o único gênero que eu hesito em assistir.

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