quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Batman: Ano Um


Num momento em que a DC Comics estava reconstruindo a imagem de seus principais personagens, para introduzi-los ao público jovem, Frank Miller e David Mazzucchelli escreveram e desenharam, respectivamente, a minissérie Batman: Ano Um, recontando o primeiro ano de Bruce Wayne como Batman. Agora, o clássico foi adaptado pela Warner Bros., que já vem produzindo, há anos, histórias do Universo DC em longas animados para home video.

Na trama, o playboy Bruce Wayne acaba de retornar à sua cidade-natal, Gotham, após uma série de viagens. Ao mesmo tempo, chega à cidade o tenente James Gordon, vindo de Chicago, com sua esposa grávida, para integrar a força policial de Gotham.

Gordon é um policial extremamente honesto que se vê em meio a mais pura corrupção, a qual tenta combater como pode. Frustrado por viver numa cidade tão violenta e sem esperança, prestes a entregar o próprio filho para esse mundo, o drama de Gordon é o mais interessante do filme.


Bem sucedido no drama de Gordon, mas nem tanto no do homem-morcego. Bruce tem o plano de combater o crime. Após uma tentativa equivocada, ele se senta de frente para o busto de seu pai e clama por indicações de qual caminho seguir.

Em seguida, vemos um flashback sem emoção da morte do Sr. e Sra. Wayne. O último toque de inspiração quebra a janela do cômodo em que Bruce estava e pousa sobre o busto. E, assim, surge Batman – que em sua próxima cena já aparece correndo por Gotham com seu traje.

O filme mantém a falta de profundidade no super-herói até o fim, dando mais destaque ao tenente Gordon – o que não é de todo mal, já que ele é um personagem importante em toda a franquia, mas se tratando de uma história sobre a origem do super-herói, esperava-se mais foco nele e seu amadurecimento em seu primeiro ano de atuação contra o crime.


Também é interessante a breve participação da Mulher-Gato, Selina Kyle, e sua origem como prostituta que se inspira em Batman para costurar seu traje e se tornar uma ladra.

Como se já não bastasse a falta de destaque do personagem-título, a voz que ele ganhou nessa adaptação também não foi bem escolhida. Ben McKenzie (o eterno Ryan de The O.C.) parece não ter se esforçado como deveria na carga dramática do personagem, além de sua voz não ser o mínimo de grave que qualquer fã dos filmes de Christopher Nolan espera.

No geral, a dublagem dos demais personagens é competente. A voz de Bryan Cranston (Drive, Breaking Bad) combina como uma luva para James Gordon, enquanto Eliza Dushku (Dollhouse) dá o tom sensual e vulgar que a Mulher-Gato da história deve ter.


Com uma animação bonita e fluida, a trama madura de Batman: Ano Um – que teve imensa influência sobre Batman Begins e O Cavaleiro das Trevas e é considerada uma das melhores HQs de todos os tempos – recebeu uma adaptação fiel que, sem dúvida, vai agradar os fãs de um dos super-heróis mais impressionantes já criados.

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Batman: Year One, 2011
Gênero: Ação, Animação, Super-herói
Diretores: Lauren Montgomery e Sam Liu
País: EUA
Duração: 64 min
 
Nota: 7



segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Os Agentes do Destino


Imagine que uma organização manipula a vida de todos os seres humanos, minuciosamente, seguindo livros com o plano completo da vida de cada pessoa. Em Os Agentes do Destino, isso é real.

Candidato ao Senado americano, David Norris (Matt Damon) conhece a atrevida bailarina Elise Sellas (Emily Blunt) num banheiro público masculino, durante momento decisivo da eleição ao Senado. Esse encontro faz David tomar atitudes políticas inesperadas – ou exatamente planejadas pelos "Agentes do Destino".

O casal se reúne novamente, ao acaso, contra os planos da Agência, que logo tenta separá-los. David se recusa a desistir de Elise e tem de enfrentar o próprio destino para ficar com ela.
 

O conceito de uma organização de criaturas iguais a homens (pois deixam claro que não são humanos) controlando as nossas vidas é difícil de engolir – principalmente quando vemos o “acaso” insistentemente unindo o casal que o “destino” tanto quer separar.

No entanto, o coração do filme é o casal protagonista. O carisma e a química entre Damon e Blunt são a essência do filme e sustentam a trama controversa e de difícil digestão com eficácia. 

Ao som de uma trilha empolgante e envolvendo portas imprevisíveis, as perseguições – sejam dos agentes atrás de David ou de David atrás de Elise – são o segundo ponto alto do filme.


George Nolfi é competente na direção, mas pouco ousado. No roteiro, baseado no conto Adjustment Team, do escritor Philip K. Dick, Nolfi faz um trabalho interessante acrescentando o romance e o mistério que aguça a curiosidade a todo instante. 

As explicações e desfecho são decepcionantes, mas não chegam a destruir o mérito de tudo o que vem antes. Porém, fica claro que Os Agentes do Destino poderia ser um filme mais poderoso e marcante nas mãos de um cineasta mais criativo (Christopher Nolan, por exemplo).

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The Adjustment Bureau, 2011
Gênero: Romance, Ficção Científica, Thriller
Diretor: George Nolfi
País: EUA
Duração: 106 min
 
Nota: 6,5


segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Drive


Sem sombras de dúvida o filme mais estiloso do ano (não que eu tenha assistido a todos os filmes do ano), Drive apresenta uma estética que mistura neo-noir, indie e gore com primor pelo criativo diretor Nicolas Refn (Bronson, Valhalla Rising).

“Diga a hora e o lugar e te dou 5 minutos. Aconteça o que acontecer nesses 5 minutos, estou à disposição. Seja o que for. Mas o que houver após esses 5 minutos, está por sua conta. Entendeu?”. O protagonista sem nome (Ryan Gosling), mais conhecido como Driver (motorista, em português), é um dublê de Hollywood, mecânico na oficina do Shannon (Bryan Cranston) e, de vez em quando, transporta ladrões da cena do crime para um lugar seguro, com as condições da citação acima.

Essa é somente a base inicial que o filme apresenta do personagem. O enredo vai sendo tomado por intensidade e tensão gradativamente, até o fim, enquanto o protagonista revela sua personalidade.


Mesmo sendo quieto e durão, o motorista cria laços profundos com sua vizinha Irene (Carey Mulligan) e o filho Benicio (Kaden Leos), cujo pai está na prisão. A harmonia dessa “nova família” é quebrada pelo retorno do pai de Benicio, Standard (Oscar Isaac), homem arrependido por seu passado criminoso.

Ele é ameaçado por conta de uma dívida com gangsteres e põe sua família em perigo. Sem hesitar, o protagonista se dispõe a ajudá-lo. Por ordens, Standard deve roubar uma loja de penhores com o auxílio de Blanche (Christina Hendricks), enquanto o Driver o ajudará a escapar. Contudo, o plano falha traiçoeiramente e daí em diante o motorista dirige por uma estrada infernal e sanguinária.

Na teoria, a premissa não tem muitas novidades ou inovação, mas o mistério e a estética do filme vão envolvendo a trama numa aparente complexidade que nos captura.


Excelente como sempre, Ryan Gosling vive o protagonista icônico, clara homenagem aos heróis valentes e durões de filmes antigos, como os faroestes de Clint Eastwood. Trajando sua marcante jaqueta com um escorpião amarelo estampado nas costas, o personagem revela ser tão corajoso quanto qualquer super-herói. Sua motivação é o amor por Irene e Benicio – nada mais justo, honesto e humano do que o amor como motivo para um ser humano “se tornar um herói” (entre aspas, pois não se transforma no que já se é). Ele usa sua habilidade inigualável no volante como arma, escudo e pernas.

O romance entre os personagens de Gosling e da talentosa Mulligan é doce e delicado, assim como a química sutilmente forte que há entre os dois. Em geral, as atuações estão impecáveis e carregam perfeitamente o enredo sombrio do filme. Nenhum personagem é estereotipado ou caricato; todos têm consistência e complexidade, como todo ser humano real.

A originalidade de Refn está pulsante em Drive. A atmosfera oitentista e entorpecente, por si só, já faz o filme se sobressair no gênero ação. O diretor dinamarquês, que faz sua estreia numa produção norte-americana, coloca uma câmera no banco de passageiro, do carro conduzido por Ryan Gosling, e desvenda as ruas de Los Angeles, totalmente desconhecidas por ele. A câmera usada na frente ou na traseira do carro, como se fosse a visão do motorista, dá um toque especial para as cenas de fugas.

 

A iluminação do filme é crua e natural, o que ajuda na imersão do espectador. Uma bela exceção é o beijo desesperado no elevador, no segundo ato do filme, em que Refn brinca com a iluminação combinando com o impacto da cena.

Baseado num livro de 160 páginas de James Sallis, o roteiro escrito por Hossein Amini “linearizou” a narrativa cheia de flashbacks e saltos no tempo de Sallis, com exceção de alguns momentos em que o breve futuro (ou passado?) se intercala com o presente – tudo muito bem executado por Refn.

Drive tem mais violência do que aparenta. Uma ação visceral surpreendente para quem ainda está com a imagem do motorista na margem de um riacho, com Benicio e Irene, quente na memória.


A ótima trilha sonora de Cliff Martinez é composta de um synth-pop inquietante e retrô, que só cessa para dar lugar ao ronco dos motores dos carros. Destaque para a canção “A Real Hero”, a mais marcante do filme, cujo refrão remete perfeitamente ao protagonista sem nome. “And you have proved to be a real human being”. “A real hero, real human being”. Poucas trilhas sonoras são tão importantes para climatizar um filme como essa.

Aliás, o retrô não está só nas músicas: está no filme inteiro. A trilha, os carros, os locais e até a tipografia da abertura criam um clima que torna a época do filme indistinguível. Os produtores tiveram até o cuidado de evitar que prédios novos aparecessem no filme – apenas as tomadas aéreas mostram os arranha-céus de L.A., nos lembrando que o filme se passa no século atual.

Nicolas Refn é um dos diretores mais criativos da atualidade e, importante, sabe executar seu talento com eficiência. Drive é a prova concreta disso: um thriller melancólico, instigante, brutal e tocante, de primeira qualidade.

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Drive, 2011
Gênero: Ação, Thriller, Drama 
Diretor: Nicolas Winding Refn
País: EUA
Duração: 100 min

Nota: 10


sábado, 1 de outubro de 2011

Amor, Sublime Amor


Em 1961, Amor, Sublime Amor colocou o gênero musical num novo patamar por integrar, de maneira inédita no Cinema, a dança e a música como forma de narrativa.

Adaptado do musical de 1957, da Broadway – que por sua vez é adaptado fielmente da tragédia Romeu e Julieta, de William Shakespeare – o filme aborda o romance proibido entre o ex-líder dos Jets, Tony (Richard Beymer), e a imigrante porto-riquenha irmã do cabeça dos Sharks, Maria (Natalie Wood). As duas gangues travam uma guerra pelo domínio das ruas de Nova Iorque, na década de 50.

O filme faz críticas importantes sobre a violência impulsiva das gangues e o racismo com imigrantes latino-americanos, especialmente para a época em que foi feito. Tenente Schrank (Simon Oakland) é um policial claramente preconceituoso que diz querer a paz das ruas, enquanto apóia os Jets e até se solidariza para ajudá-los a dar um fim nos Sharks. Enquanto isso, a gangue de imigrantes exprime seus sentimentos através da música “America”. “Compra a crédito é tão bom”, “um olhar para nós e eles cobram o dobro”. “A vida é boa na América”, “se você é branco na América”.


Com letras do aclamado compositor Stephen Sondheim, as músicas de Amor, Sublime Amor divertem e emocionam expressando os sentimentos de seus enunciadores. Os fãs do gênero se satisfarão com a riqueza de números de dança e música, todos devidamente amarrados ao enredo – característica essencial de um bom musical.  

Clássico na Europa e, principalmente, nos Estados Unidos, o gênero musical nunca teve tal popularidade no Brasil. Para quem não está acostumado, fica difícil de acreditar em um mundo em que todas as pessoas cantam e dançam bem e a todo o momento, sem razão aparente, ao som de instrumentos invisíveis – ao menos na tela do cinema, pois é facilmente crível no seu palco de origem, o teatro.


O roteiro tem sucesso ao transportar Romeu e Julieta para a Nova Iorque dos anos 50, porém o drama não é executado com o peso de uma tragédia. Na metade do segundo ato, Maria perdoa Tony com tal rapidez que só colabora para a inverossimilhança do filme, que, até aí, se limitava aos números musicais e à ausência de sangue – afinal, logo nos acostumamos à teatralidade das interpretações e performances musicais.

A falta de peso é sentida principalmente na cena final, onde não apenas o roteiro, mas as atuações também deixam a desejar. Todos haviam sido (teatralmente) competentes por todo o filme, até que Beymer (Tony) falha ao passar a emoção necessária no clímax da história e entrega um desfecho fraco para o clássico.

Amor, Sublime Amor é um merecidamente um clássico por sua importância para o gênero e pela crítica que faz à mentalidade preconceituosa do norte-americano numa época em que negros, índios e latino-americanos eram, por lei, considerados seres inferiores, nos Estados Unidos. Mas deixo uma dica: quem nunca assistiu a um musical e quer ingressar neste gênero, não deve começar por Amor, Sublime Amor. Recomendo um musical pós-moderno, como Rent – Os Boêmios ou Canções de Amor.

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West Side Story, 1961
Gênero: Musical, Drama, Romance 
Diretores: Robert Wise, Jerome Robbins
País: EUA
Duração: 152 min

Nota: 7